domingo, 20 de abril de 2014

O JARDIM DOS FINZI-CONTINI


Várias vezes já citei aqui no blog a quantidade de filmes baseados em obras literárias, eu sou quase enfático ao escrever sobre isso, o melhor amigo do cinema é o livro. Para o bem e para o mal, como tudo nessa vida, há verdadeiras obras primas e fiascos retumbantes. Como hoje é domingo de Páscoa e coincidentemente o terceiro dia de um feriado prolongado, acordei naquele estado letárgico de quem pensa; hoje posso dormir até tarde, bem tarde. Mas o cérebro já está a funcionar e muitas lembranças surgem com o tema do dia: Páscoa. Lembro-me dos domingos na infância em São Gonçalo dos Campos, interior da Bahia, com meus avós maternos, e nesse momento volta a memória um filme antigo do Vittorio de Sica que assisti a muito tempo chamado O Jardim dos Finzi-Contini.

Quem conhece a obra escrita por Giorgio Bassani (1916-2000) que inspirou o filme pode não associar o livro com a Páscoa, já que se trata da história de uma tradicional e riquíssima família judia italiana condenada a uma morte anônima num campo de concentração nazista durante a guerra. A obra descreve o cotidiano dessa família, os jovens que a cercam e suas diferenças de pensamento e personalidade. Durante o período entre 1938 e 1943 o regime fascista apertava mais e mais o cerco contra os judeus, a liberdades iam pouco a pouco sendo retiradas e os ricos enclausuravam-se em suas belas residências, jogavam tênis e mantinham seus jardins impecáveis como uma prova sutil de que a vida continuava a mesma. O momento do golpe chegando e as pessoas aguardando pacientemente, como se estivessem sentadas numa estação esperando o trem que iria leva-las.

Conheceremos Micòl e seu irmão Alberto, Giogio nosso protagonista, e Bruno Malnate, simpatizante socialista amigo de Alberto. Embora escrito na primeira pessoa o romance é um monumento à memória de Micòl tanto que quando se encerra sua participação interrompe-se também a do protagonista. Na minha modestíssima opinião, uma figura tão fascinante e enigmática quanto Blanche Du Bois de Um Bonde Chamado Desejo.

Nesse domingo lembrei a cena filmada por Vittorio de Sica, a família de Giorgio reunida para celebrar a Páscoa cantando hinos hebraicos e a ameaça chegando através do telefone, o holocausto já está acontecendo, mas é preciso continuar vivendo e festejando com os cânticos tradicionais. O telefone toca, Giorgio atende e ninguém fala do outro lado, ligação interrompida ou uma ameaça? Depois toca de novo, a vozes cantantes se abaixam, o medo estampado em seus rostos, de novo não se ouve nada do outro lado. No terceiro toque Alberto fala do outro lado da linha, todos respiram, não é a polícia, não são os fascistas, todos relaxam, deixam cair o véu da paranoia e as vozes voltam a cantar alto.

Belíssima sequencia do filme narrada com maestria no livro. Vale à pena.

Cidade do abandono: Salvador/BA
Local: Estacionamento da Perini - Graça
Data: 01/06/2014

Nenhum comentário:

Postar um comentário